Wednesday, April 19, 2006

VOCAÇÃO

“Cada um permaneça na vocação em que foi chamado. Foste chamado, sendo escravo? Não te preocupes com isso; mas, se ainda podes tornar-te livre, aproveita a oportunidade. Porque o que foi chamado no Senhor, sendo escravo, é liberto do Senhor; semelhantemente, o que foi chamado, sendo livre, é escravo de Cristo.”
I Co 7.20-22

A palavra “vocação”, na literatura neotestamentária, origina-se do verbo grego kaleo que significa “eu chamo, eu nomeio, eu convoco”. O substantivo klêsis significa “vocação, chamado, convite”. O adjetivo kletós significa “chamado, convocado”.
Se me fosse pedido apenas uma palavra que representasse o significado mais autêntico de vocação, escolheria IRRESISTÍVEL, um encontro único e pessoal com o Criador (ou representante) a fim de que o homem receba sua missão a fim de glorificar o Nome de Deus. De fato, pode existir hesitação (Ex 4.13), a primeira vista, da parte do homem, contudo, como os planos de Deus são infalíveis, o vacacionado, se esse realmente o é, submete-se a lapidação divina sendo capacitado para cumprir sua missão. Muitas são, ao longo da Bíblia, as narrativas de vocação, basta-nos folhear as páginas que nos deparamos com homens sendo desafiados por Deus para marcar vidas segundo a soberana vontade do Pai.
Uma das características mais marcantes das “narrativas de vocação” são os verbos no modo imperativo afirmativo (por exemplo: enviar e ir), que caracterizam o desígnio da missão e o sujeito desses verbos atribuindo-lhes divindade. No Antigo Testamento, era claro o fato de Deus levantar líderes no meio do povo para representá-Lo. Muitas são as narrativas nas quais Deus escolhe homens que serão responsáveis por guiar o povo nos retos caminhos: Êx 3.10-12; Jz 6.14b; Is 6.8; Jr 1.7; Ez 2.3,4.
Falar de vocação é entender o real sentido da existência humana, viver um relacionamento íntimo com a Trindade. Se seguirmos uma linha puritana mais abrangente, vocação estaria ligado ao “ato de chamar” comunitário. Como todos fomos criados para um determinado fim, todo aquele que nasce de novo, é vocacionado a ter uma vida de santidade (I Co1.2). Nesse aspecto, por termos sido feitos sacerdotes reais, é necessário que nossa carreira, seja ela religiosa ou não, seja exercida com todo o empenho, já que essa é vontade de Deus para o seus, manifesta nas aptidões que o próprio Senhor nos concede – assim, pois, lembre-se cada um de que foi criado por Deus s fim de trabalhar diligentemente e de entregar-se à sua tarefa, e isto não por um tempo, pelo contrário, até a morte e, mesmo, não somente para viver,mas ainda para morrer por Deus –
Entretanto, num sentido restritamente teológico, vocação designa-se da ação de Deus a chamar alguns, a quem Ele escolheu, para a Sua obra. Vale lembrar, no entanto, que é sempre Deus quem tem a iniciativa de chamar o homem para fazer parte de seus planos de redenção da humanidade, e nunca o oposto, como o próprio Cristo afirma: “não foste vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros, e vos designei para que vades e deis frutos, e o vosso fruto permaneça”.
Um dilema, porém, que muitos cristãos se deparam, é o de saber se realmente são vocacionado por Deus para assumir um ministério específico, por meio de um chamado individual, como os grandes exemplos de fé bíblicos. Esse momento de provação revela se o chamado é fruto da vontade de Deus manifesta desde toda a eternidade ou apenas um devaneio causado por alguma emoção momentânea e passageira. É fundamental, portanto, ter a certeza que esse convite vem da parte de Deus, conforme lhe aprouve, de maneira benevolente, escolher para Seu propósito. Desse modo, nossa convicção deve ser alicerçada nas Escrituras, entender que o maior sintoma da nossa vocação é o profundo amor por almas que ainda não foram alcançadas e a não conformação com a realidade circundante dentro e fora de nossas igrejas.
Cabe ressaltar, no entanto, que por muitas vezes, atender ao chamado implica em renúncia (Mt 16.24), perseguição (II Tm 3.12) e, até mesmo martírio (Hb 11.37). Dessa forma, preparar-se para a missão por meio de uma vida na presença do Senhor é de suma importância. Além disso, é necessário aprender a viver na dependência de Deus, somente assim, consegue-se o ânimo necessário para colher na seara. Como diria um grande teólogo: “temos que ter certeza do nosso chamado, caso contrário, ao invés de construir, destruiremos”.
Fica claro, portanto, que vocação é o resultado da ação de Deus, por Ele viabilizado, mediado por Cristo e tendo o Espírito Santo como agente. O homem, por si só, é inapto (1Co 1.26-29) a receber tamanha graça (1Tm 1.12-14). Deus nos convoca (Ef 1.5) a participar de um relacionamento íntimo com Ele, escolhendo a todos quanto quis (1Co 12.18; Fp 2.13; Rm 9.11). Somente Deus é o sujeito de o verbo chamar (Rm 9.25) e, a nós, só nos resta dizer: EIS-ME AQUI!

“Assim, pois, lembre-se cada um, de que foi criado por Deus a fim de trabalhar diligentemente e de entregar-se à sua tarefa, e isto não por um tempo, pelo contrário, até à morte e, mesmo, não somente para viver, mas ainda para morrer para Deus”

“De boas palavras transborda o meu coração; ao Rei consagro o que compus” Sl 45.1

Monday, April 17, 2006

Por uma Páscoa Feliz

Judas Redivivo e Desagravado

Cumprindo o ritual que acontece todos os anos na época da Páscoa, a grande mídia acaba de veicular mais uma matéria bombástica diretamente relacionada com o Cristianismo. Trata-se da tradução de um manuscrito copta do século IV que supostamente conteria uma tradução do evangelho apócrifo grego de Judas, cuja origem é estimada em meados do século II. A restauração e a tradução do manuscrito copta foram anunciadas nessa quinta-feira, 6 de abril, pela National Geographic Society em Washington.
A veiculação pela mídia vai na mesma linha de propaganda e especulações anticristãs voltadas mais diretamente contra a Igreja Católica Romana e que acaba respingando nos protestantes, especialmente nas igrejas históricas. O ano passado foi o Evangelho de Tomé. Uma suposta sepultura de Jesus, uma inscrição antiga contendo o nome de Tiago, irmão de Jesus, e outras “descobertas” arqueológicas, fizeram a festa da mídia em anos mais recentes.

Ninguém deve se assustar pensando que essa atitude é um fenômeno atual. Desde os primórdios do Cristianismo, escritores pagãos como Celso e Amiano Marcelino publicam material atacando as Escrituras e o Cristianismo. A ignorância dos articulistas, o preconceito anticristão, a busca do sensacionalismo, tudo isso contribui para que a publicação do manuscrito copta receba uma atenção muito maior do que a devida.

Não quero ser mal compreendido. Como pesquisador e estudioso do Novo Testamento, estou sempre aberto para descobertas arqueológicas e novas pesquisas que nos tragam subsídios para melhor entender o mundo do Novo Testamento e a sua mensagem. Creio que a publicação do evangelho de Judas contribui para nossa compreensão do Gnosticismo e da seita dos Cainitas, autora do documento.


Contudo, estou acostumado a assistir, anos a fio, a exploração sensacionalista dessas descobertas. Lembro-me bem da descoberta dos Manuscritos do Mar Morto e das polêmicas e questões inclusive legais que envolveram a tradução e a publicação dos primeiros rolos. A imprensa da época especulava que os Manuscritos representariam o fim do Cristianismo, pois traria informações que contradiriam completamente o Evangelho. Os anos se passaram e verificou-se a precipitação da imprensa. Os rolos na verdade tiveram o efeito contrário, confirmando a integridade e autenticidade do texto massorético do Antigo Testamento.

Com o objetivo de esclarecer e trazer alguma sobriedade na avaliação da publicação, faço as seguintes observações sobre a publicação do texto do manuscrito.

1. Não se trata da descoberta do Evangelho de Judas. O mesmo já é um velho conhecido da Igreja cristã. Elaborado em meados do século II, provavelmente na língua grega, era conhecido de Irineu, um dos pais apostólicos. Na sua obra Contra as Heresias, Irineu o menciona explicitamente, como sendo uma obra espúria produzida pelos gnósticos da seita dos Cainitas. No século V o bispo Epifânio critica o Evangelho de Judas por tornar o traidor em um feitor de boas obras.

2. Não se trata também da descoberta de um manuscrito antes desconhecido contendo essa obra. Acredita-se que o único manuscrito conhecido, escrito em copta, foi descoberto em meados da década de 1950 e depois de uma longa peregrinação nas mãos de colecionadores, bibliotecas, comerciantes de antiguidades e peritos, chegou às mãos das autoridades. Sua existência foi anunciada ao mundo em 2004. Trata-se de um códice com 25 páginas de papiro, envoltas em couro, das 62 páginas do códice original. Somente essas 25 páginas foram resgatadas pelos especialistas. A tradução que vem a lume agora é dessas páginas.

3. O que é de fato novo é a tradução do texto desse apócrifo, texto até então desconhecido. Contudo, o ponto central que a mídia tem destacado com sensacionalismo, já era conhecido mediante as citações de Irineu e Epifânio, ou seja, que esse evangelho procura reabilitar Judas da pecha de traidor, transformando-o em vítima e herói. Na década de 80 saiu o romance "Eu, Judas", de Taylor Caldwell, publicado pela Círculo do Livro, onde essa versão revisada de Judas foi difundida.

4. Várias matérias publicadas na mídia dizem que Judas Iscariotes é o autor desse evangelho. Contudo, não existe prova alguma disso. Segundo o relato dos quatro Evangelhos canônicos, Judas suicidou-se após a traição. Como poderia ser o autor dessa obra? Irineu, no século II, atribuía a autoria do evangelho de Judas aos Cainitas, uma seita gnóstica. No códice descoberto e agora publicado, não consta somente o evangelho atribuído a Judas, mas duas obras a mais: a “Carta a Filipe” atribuída ao apóstolo Pedro e “Revelação de Jacó”, relacionado com o patriarca hebreu. A presença do evangelho de Judas em meio a essas duas obras apócrifas é mais uma prova da autoria espúria desse evangelho. Chega a ser irritante o preconceito da mídia, que sempre veicula matérias que negam a autoria tradicional dos Evangelhos canônicos, mas que rapidamente atribui a Judas Iscariotes a autoria desse apócrifo.

5. Evangelhos apócrifos e pseudepígrafos eram comuns nos primeiros séculos da era cristã. O Evangelho de Judas é mais um deles. Outros, mais conhecidos, são o Evangelho aos Hebreus, o Evangelho de Tiago, o Evangelho de Maria Madalena, o Evangelho de Filipe, o Evangelho de Tomé, entre outros. O texto desses apócrifos já é conhecido de longa data. Judas, contudo, somente agora vem à lume.

6. O manuscrito que agora foi traduzido não data do século II, mas do século IV. Especula-se que é uma tradução para o copta de uma obra mais antiga escrita em grego, que por sua vez dataria de meados do século II. Daí a inferir a autoria de Judas Iscariotes, que morreu na primeira parte do século I, vai uma grande distância. A seita dos Cainitas, segundo Irineu em Contra as Heresias, era especialista em reabilitar personagens bíblicas malignas, como Caim, os sodomita e Judas. A produção de um evangelho reabilitando o traidor se encaixa perfeitamente no perfil da seita.

Ao final, pesando todos os fatos e filtrando o sensacionalismo e o preconceito anticristão, a publicação do evangelho de Judas em nada contribuirá para nosso conhecimento do Judas Iscariotes histórico, apenas para nosso maior conhecimento das crenças gnósticas do século II. Não representa qualquer questionamento sério do relato dos Evangelhos canônicos, cuja autoria e autenticidade são muito mais bem atestadas, datam do século I e receberam reconhecimento e aceitação universal pelos cristãos dos primeiros séculos.

Tuesday, April 11, 2006

O Globo: 2075


Outro dia me perguntaram o que eu gostaria de ler nos jornais e revistas sobre a igreja evangélica no ano de 2075. Eis um texto que eu sonho em ler:



As igrejas evangélicas superaram um difícil obstáculo: a união para criação de modelos e padrões de qualidade que reflitam os princípios bíblicos e mantenham as igrejas na direção de cumprirem a missão para a qual foram criadas, fazer discípulos. Muitas igrejas alcançaram padrões mundiais de qualidade, demonstrando que isso é plenamente viável no ministério. As denominações também conseguiram identificar os parâmetros que contribuem para o crescimento qualitativo da igreja e aprenderam com seus erros para fazer melhor o que faziam antes.
O desafio de fazer discípulos em todas as nações ainda existe, mas agora as igrejas podem se concentram mais nesse desafio do que em seus problemas internos, que embora ainda existam, ocupam a posição secundária como deve ser. As frentes de trabalho são convergentes e reduzidas, oferecendo programas com qualidade e relevância. A auto-avaliação através de critérios elevados de qualidade tem ajudado aos ministérios na identificação de seus pontos fortes e fracos.
O maior obstáculo para o avanço desse processo ainda é a falta de compromisso da liderança eclesiástica com a busca constante pela excelência, que significa abandonar antigos paradigmas e adotar novos métodos para atingir os mesmos objetivos definidos há mais de dois mil anos. Também não compreendem que precisamos fazer do melhor jeito e não do nosso jeito, e que devemos negociar o negociável e não negociar o inegociável, a sensibilidade da percepção do que é ou não negociável é transcendental e depende da relação com Deus.
A gestão qualidade deve ser vista como um meio para alcançarmos a meta da melhor forma e com os melhores resultados, nunca deve ser vista como um fim. Mas o grande pulo do gato está nos resultados, o que queremos como resultado de nosso trabalho? No final do ano o que gostaríamos de apresentar como “lucro” das nossas atividades na igreja? Pessoas, esse deve ser o foco. Mas não apenas um objetivo numérico, mas qualitativo, ao olhar para a igreja e observarmos o sr. João que assiste todos os cultos da semana devemos trabalhar para que o sr. João seja mil vezes mais capacitado para ser um bom discípulo, guardião e pregador do evangelho que também prepara novos membros para crescerem e cumprirem seu papel. Porém muitos líderes ainda estão preocupados em encherem seus templos com mil pessoas como o sr. João, que freqüenta a igreja a muito tempo mas que ainda é imaturo na fé. O modelo da idade média ainda resiste em denominações que apostam na ignorância dos membros e em celebrações emocionantes.
Apesar de tudo, os historiadores falarão no futuro que esse século foi o século do resgate da qualidade na igreja. Hoje, pessoas chegam nas igrejas e são logo acolhidas por membros mais maduros e preparados para cuidar de pessoas e apresentar o evangelho integral para os novos membros, acompanhando seu crescimento e orientando. As escolas bíblicas possuem professores treinados e recursos adequados, todos os ministérios são orientados para aproveitar a vocação e os dons de cada membro, que logo após seu batismo participa de um programa de identificação de dons e talentos. A liderança é altamente preparada e participa de fóruns e congressos constantemente, e trabalha com transparência no objetivo de preparar as pessoas, todos os líderes demonstram claramente que seu papel é fornecer aos membros ferramentas para que cada um desempenhe seu papel, desenhando uma direção e capacitando cada um pra ajudar a igreja a caminhar nesse sentido.
Acompanhamento psicológico e assistência social com a orientação correta são marcas registradas da igreja de hoje, que dispõe de recursos da iniciativa privada mobilizados pela crescente tendência de responsabilidade social e estimulados pela transparência e qualidade das igrejas além dos incentivos fiscais.
Cada pessoa sabe que encontrará conforto e uma palavra de amor nas igrejas cristãs e já não ouvimos mais piadas e escândalos envolvendo cristãos. As redes de TV e rádio adequaram sua programação aos padrões morais da igreja e aos horários dos cultos, hoje os jogos de futebol são das 16h às 18h e o Fantástico começa às 21h, para não perderem o público cristão. As excelentes músicas cristãs são apreciadas por todas as pessoas, os bons livros de autores cristãos estão sempre entre os mais vendidos, revistas como Veja, Istoé, e jornais de grande circulação em todo país possuem colunas escritas por pastores e teólogos brasileiros.
Os índices de analfabetismo, desemprego, criminalidade e violência doméstica diminuíram sensivelmente nas cidades de maioria evangélica e os líderes de países muçulmanos tentam obter os mesmos resultados copiando o modelo brasileiro de integração igreja-governo sem muito sucesso.

Isso seria um devaneio meu ou uma possibilidade? Creio que nunca saberemos a resposta se não tentarmos mudar radicalmente a forma como andamos com Deus, pois o que temos não passa de um rascunho superficial do que deveria ser a igreja.
Eu quero tentar, mas o incêndio da floresta é grande demais pra um só passarinho. O que fazer? Vocês vão comigo ou devo desistir e ir cuidar da minha vida?






"TEMOS QUE SER A MUDANÇA QUE QUEREMOS VER"

Friday, April 07, 2006

sou feita de vocês

Ahh... Se
todos
no
mundo
fossem
iguais
a
vocês
...
Amo
muito
TUDO
isso
!!!
=)

Thursday, April 06, 2006

O Cristo Radical

por: Alex Buchan e Paul Estabrooks

“Sigo a Jesus porque Ele é o único sujeito da história que teve a coragem de ensinar que para mudar o mundo realmente, é necessário quebrar a lei para poder cumpri-la.”Um cristão indiano, ex-extremista hindu Ex-líder do alto escalão de uma organização extremista hindu, Valson – não é seu nome verdadeiro – veio a Cristo depois de espancar um cristão de Karnataka, na Índia. Ele foi tocado pelo desafio do evangelista: “Você se dispõe a me bater e rejeita a religião sobre o qual não leu nada a respeito.”Aquilo incomodou Valson, já que ele se considerava uma pessoa estudiosa. Por isso ele decidiu ler os Evangelhos. Começou com Mateus e ficou chocado ao ler no capítulo 5:20: “Se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus.”O que o abalou foi o fato de que Jesus tinha uma interpretação de como cumprir a lei do Velho Testamento radicalmente diferente de todos os entendidos religiosos. Jesus disse que não tinha vindo para abolir a lei, mas para cumpri-la. O que isso significava?Enquanto ele continuava lendo, ficava claro que os escribas e fariseus estavam convencidos de que Jesus estava transgredindo a lei o tempo todo. Ele quebrou as leis do sábado ao curar o enfermo e ao permitir que seus discípulos comessem. Ele transgrediu as leis rituais ao comer com o impuro. Ele até se recusou a aplicar a lei moral ao deixar de condenar à morte uma mulher pega em adultério.Valson estava atônito e confuso, como ele mesmo declarou: “Eu nunca percebera que os cristãos seguiam alguém tão radical, que estava sempre desobedecendo leis. Mas era difícil conciliar isso com o que Jesus havia dito: ‘Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas: não vim para revogar, vim para cumprir’ (Mateus 5:17). Como Jesus cumpriu a lei transgredindo-a o tempo todo?”Então ele procurou o evangelista que espancara. Aquele homem explicou: “Bem, a comunidade à qual Mateus estava escrevendo era composta de judeus que provavelmente tinham sido postos para fora da sinagoga. Eles eram perseguidos por causa de sua nova fé, mas queriam saber o quanto de sua origem judaica deveriam reter. Assim, Mateus está lhes ensinando aquilo que Jesus chama de ‘justiça superior’ e que significa que para toda lei que encontramos devemos perguntar: ‘ Qual é a vontade de Deus que está por trás desse mandamento, e como devemos obedecer essa vontade?’O evangelista deu alguns exemplos. “Jesus curou um homem no sábado. Ele transgrediu o mandamento literal para poder cumprir a verdadeira essência da lei, pois por trás da lei do sábado está a intenção de aliviar os homens das cargas do sofrimento e da fadiga.”Valson ficou maravilhado. “Esse Jesus foi muito radical e, de repente, percebi que eu também não era melhor do que um fariseu”, disse ele mais tarde. “Toda minha religião era apenas uma estúpida obediência cega às exigências superficiais dos mandamentos, e eu nunca refletira no que poderiam significar de fato aquelas ordens. Mesmo no hinduísmo, supõe-se que tratemos bem o estrangeiro, mas nós deixamos o sentido literal das normas afastar a essência.” Obviamente, Valson não quer dizer que todas as leis têm de ser transgredidas para serem cumpridas. Jesus estava falando basicamente das leis do Velho Testamento e a visão de Valson é bastante clara. No entanto, ele percebeu muito claramente que quando um grupo religioso se torna uma “cultura do mandamento”, a obediência excessivamente zelosa às regras resulta, na prática, na capacidade de se apreciar o núcleo do mandamento ou, ainda, de se viver a liberdade para a qual a lei foi inicialmente criada.É como Valson declarou: “Estou convencido de que qualquer um que seja realmente religioso – cristão, hindu ou qualquer outro – desejaria recrucificar a Cristo! Todos nós tentamos chegar a Deus pela obediência às leis, e Cristo diz que nunca vamos consegui-lo dessa maneira. Isso é até insultante, mas é verdade. Não é o caminho da obediência que leva à salvação, mas o caminho do amor e do relacionamento. Cristo, no entanto, ainda permanece radical demais para a maioria de nós.”

Extraído do livro A palavra dos perseguidos, que traz testemunhos dos cristãos perseguidos. O livro é uma publicação da Portas Abertas e faz parte da coleção Linha de frente.